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segunda-feira, 23 de setembro de 2013

A colina das cruzes: o lugar que humilhou uma e outra vez a URSS e o KGB

Curiosa expressão de fé do povo lituano 

Colina das cruzes
Actualizado 21 de Setembro de 2013

Javier Lozano / ReL

Há escassos dias a Igreja celebrava a festa da Exaltação da Santa Cruz e se algum lugar no mundo pode reflectir de maneira gráfica o seu poder não é outro que um recôndito canto no norte da Lituânia, que sem dúvida, tem um grande símbolo visível: a colina das cruzes. Um lugar que mostra de maneira impressionante o poder da fé e a esperança sobre a opressão e o sofrimento.

A colina das cruzes está situada a doze quilómetros ao norte da cidade industrial de Siauliai e converteu-se no grande lugar de peregrinação do povo lituano. De facto, neste importante enclave manifestou-se a cruz como gloriosa e serviu como uma honra para o povo lituano nos seus momentos de maior dificuldade.

A resistência pacífica dos católicos

E foi precisamente sempre nos momentos mais convulsos quando a colina das cruzes se erigiu como o grande farol dos crentes. A cruz guiou e dirigiu o povo até Cristo e a sua mãe à Virgem.

Desde há séculos, a colocação de cruzes nesta colina representou a resistência pacífica dos católicos contra a opressão. Experimentou um auge no século XIX quando numa rebelião dos camponeses contra o Czar, este não permitiu às famílias honrar os seus mortos. Colocaram cruzes em sua honra apesar da oposição das autoridades. Pouco a pouco o número de cruzes e o tamanho destas iam crescendo paulatinamente.

Sem dúvida, este exemplo de resistência mostrou-se de maneira mais clara durante a ocupação soviética e a repressão do regime comunista aos cristãos. Quando Lituânia foi anexada à URSS a colina das cruzes já era um lugar sagrado para os lituanos. Milhares de cruzes enchiam a pequena montanha.

O ódio do comunismo à cruz
Evidentemente a União Soviética não podia permitir que a cruz brilhasse pelo que se empenhou em destruir qualquer indício de cristianismo. E esta colina representava um desafio ao seu poder e um problema de ordem pública.

Naquele momento, a URSS deportou uma quinta parte dos lituanos para a Sibéria e instaurou um férreo sistema ateísta que pretendia arrancar a fé da alma deste povo. Por isso, os lituanos agarraram-se à fé e converteram esta colina como um sinal da sua luta por conservar o mais profundo do seu ser.

Apesar da ocupação soviética e a proibição de colocar cruzes, pouco a pouco a colina ia tendo cada vez mais. De noite e de maneira sigilosa conseguiam colocá-las naquele lugar sacro.

O KGB, irritado ante esta manifestação de fé decidiu em 5 de Abril de 1961 arrasar com o lugar. Naquele dia bulldozers soviéticos destruíram todas as cruzes. As de madeira foram queimadas, as de metal utilizaram-se como sucata e as de pedra foram trucidadas e enterradas. Com isto acreditavam que tinham vencido mas equivocaram-se e muito. 

Sempre apareciam mais cruzes
Para grande surpresa da inteligência soviética na manhã seguinte uma espécie de milagre tinha ocorrido. A colina voltava a amanhecer repleta de cruzes. Os lituanos voltaram de noite e de maneira cuidadosa e sigilosa encheram de cruzes a colina.

Nem as ameaças nem as detenções puderam parar esta motivação dos católicos lituanos. Sem dúvida, a URSS não se deu por vencida e voltou a arrasar várias vezes o lugar. Apesar de estar custodiada pelo Exército e agentes do KGB, a colina amanhecia de novo repleta de cruzes.

Ante estes inesperados fracassos, as autoridades soviéticas experimentaram outros estratagemas. Numa ocasião as destruíram alegando a falta de valor artístico, noutras alertaram de várias epidemias na zona que impediam aproximar-se das colinas e inclusive chegaram a bloquear as estradas.

Em vão. Não puderam apagar a manifestação de fé do povo lituano. Cada vez que as cruzes eram destruídas, apareciam mais; quando o Exército bloqueava os acessos inexplicavelmente os vizinhos engenhavam-nas para introduzir enormes cruzes no lugar. Inclusive, a URSS em 1978 tratou de inundar de água o lugar e afundá-lo acabando assim com a colina. Tampouco o conseguiram.

O KGB dá-se por vencido

O cúmulo desta expressão de fé produziu-se em 1979 quando um sacerdote se atreveu a desafiar o regime comunista e foi em procissão até ali junto com toda a paróquia.

Finalmente, o KGB deu-se por vencido e deixou em paz a colina das cruzes pois o seu ódio à fé alimentava ainda mais o amor a Cristo dos lituanos. Assim, o lugar descansou tranquilo até à queda da URSS, o que supôs o fim da tirania convertendo este lugar no grande santuário da Lituânia.

Milhares de cruzes de todos os tamanhos e tipos permanecem ali. Pelos mártires, pelos familiares, por intenções ou simplesmente como agradecimento a Deus. As há de todos os tipos e tamanhos. As que vão de vários metros de altura às que apenas supõem um par de centímetros.

A visita de João Paulo II

Em 1993 o Papa João Paulo II visitou este lugar e o deu a conhecer ao mundo inteiro.

Ficou impressionado por esta enorme manifestação de fé e comovido ao encontrar uma grande cruz cravada em 1981, em plena ditadura, depois de sofrer o atentado e que tinha inscrito: “Cristo tem piedade do Papa, a Lituânia te o suplica de joelhos”.

Depois de voltar a Roma desta viagem disse na Audiência pública que “o encontro na colina das cruzes foi uma experiência comovedora. Esse lugar recorda-nos que continuamente o homem ‘completa o que falta às tribulações de Cristo’, segundo as palavras de São Paulo. Depois dessa visita, a todos nós nos parecia mais clara a verdade que expressou o Concílio Vaticano II, a saber, que o homem não pode compreender-se profundamente a si mesmo sem Cristo e sem a sua cruz".

Tão impressionado ficou João Paulo II com esta visita que um ano depois durante uma visita a um mosteiro franciscano em Itália, o Papa alentou os irmãos a construir um mosteiro na colina das cruzes. Em 2000 ficou consagrado e ali há agora um noviciado e uma casa de retiro. Além disso, está-se preparando a instalação de um convento de clarissas próximo daquele santuário.

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