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sábado, 26 de abril de 2014

No começo, ninguém no Vaticano entendeu o caso dos abusos

Porta-voz de João Paulo II, Joaquín Navarro Vals relata o sofrimento do pontífice quando soube dos factos


Cidade do Vaticano, 25 de Abril de 2014 (Zenit.org) Sergio Mora


O porta-voz da Santa Sé na época de João Paulo II, Joaquín Navarro Valls, deu uma breve conferência para os jornalistas que estão em Roma para acompanhar a canonização de João XXIII e do papa polaco. Centenas deles vieram do exterior.

Perguntado por ZENIT sobre como João Paulo II viveu a crise dos abusos sexuais cometidos por clérigos e se o papa tinha entendido desde o primeiro momento a enormidade do problema, Valls afirmou: “Eu acho que ele não tinha entendido, assim como ninguém tinha entendido. Se você se lembra, esse câncer começou numa área geográfica limitada, os Estados Unidos, com casos limitados. E eram casos acontecidos fazia vinte ou trinta anos, o que, de qualquer modo, não diminui a gravidade do problema”.

O ex-porta-voz recordou que as denúncias “pouco a pouco foram crescendo e o papa se preocupou muito, porque, para ele, era difícil entender o problema devido à pureza do seu pensamento. Aceitar essa realidade era algo incrível, mas ele aceitou”.

E, naturalmente, “começou a tomar decisões. Ele chamou a Roma todos os cardeais dos EUA, porque não podia trazer todos os bispos por causa da quantidade. E todos os cardeais vieram e começou a discussão sobre os casos que começavam a surgir. Também começou imediatamente a tomada de decisões, que eram de natureza jurídica”.

“Uma das decisões importantes e que mais ajudou foi dar plenos poderes, de acordo com a lei eclesiástica ou fora da lei eclesiástica vigente, ao dicastério da Doutrina da Fé, ao cardeal Ratzinger. Começou um processo de esclarecimento para entender o que fazer”.

Ainda sobre o tema, ele se referiu ao caso do padre mexicano Marcial Maciel, fundador da Legião de Cristo: “Me perguntaram esses dias, inevitavelmente, sobre um caso concreto. O caso do padre Maciel. Não digo que é o mais grave porque não vou avaliar uma coisa que não me compete”.

Valls continuou: “O processo canónico foi começado no pontificado de João Paulo II e terminou no primeiro ano de Bento XVI. E fui eu, nesta sala, que divulguei, no dia seguinte, os resultados daquela investigação”.

Também sobe o caso Maciel, a jornalista Valentina Alazraki disse que, no México, o escândalo é citado como uma mancha no processo de canonização de João Paulo II. Ela perguntou: “[O papa] estava informado? Ele decidiu iniciar o processo?”.

Navarro Valls disse que João Paulo II “não foi informado porque, quando morreu, o processo não tinha terminado. É decisão da Congregação para a Doutrina da Fé. Mas o primeiro passo foi enviar monsenhor Scicluna para os Estados Unidos para falar com todas as pessoas que disseram ser vítimas daquele problema. Isso aconteceu durante o pontificado de João Paulo II: naturalmente, ele foi informado por essa pessoa”.

“Certificar a veracidade num processo dessas dimensões, envolvendo tantas pessoas, inclusive uma em Barcelona, no México, etc., tudo isso levou tempo. E quando todo o material trazido por Scicluna foi avaliado, João Paulo II já tinha falecido”.

Aconteceu o conclave “e, nos primeiros dias do novo pontificado, não me lembro exactamente da data, eu disse ao papa Bento: ‘Santo Padre, está acontecendo isso, é um caso muito triste e temos que informar a opinião pública’”.

“O papa não ficou muito tempo reflectindo, me fez só duas ou três perguntas. O problema era como e quando informar a opinião pública. E ele me disse: ‘Amanhã mesmo’. E no dia seguinte eu informei. Estes são os tempos históricos desse processo. João Paulo II morreu quando o processo ainda estava em andamento, ou seja, não tínhamos o resultado daqueles dados, mas ele sabia que tinha começado uma investigação, um aprofundamento, durante o pontificado dele”.

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