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sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Andy García: «Para mim não é nada difícil ser católico em Hollywood; tive uma vida abençoada»

«Cristiada é universal, ilumina qualquer perseguição» 

Andy García interpreta o general Gorostieta, que começa como um ateu
e ao finalizar admira e aproxima-se da fé dos cristeros

Actualizado 13 de Outubro de 2014

Leone Grotti/Tempi.it

Em 15 de Outubro às 20:30 horas, nos Cines UCI Bicocca de Milão, estrear-se-á em Itália a película Cristiada [que na França teve bastante êxito].

O semanário Tempi, nos quiosques, dedica a capa ao acontecimento com uma entrevista exclusiva ao famoso actor de Hollywood Andy Garcia, o protagonista da película (no papel do general Enrique Gorostieta).

Um cubano católico em Hollywood
Casado desde 1982, pai de quatro filhos, exiliado cubano, crítico do regime comunista instaurado por Fidel Castro. É católico. O de Andy Garcia não é o tipo de curriculum que mais se gosta em Hollywood, mas o actor de 58 anos não necessitou nunca comprometer as suas convicções para ter êxito.

O que mais atraía o jovem Garcia era a carreira desportiva, e o basquetebol foi o instrumento que lhe permitiu superar as dificuldades de ambientação. Desembarcou em Miami em 1961, quando tinha cinco anos, sem saber nem uma palavra de inglês e no colégio ninguém lhe fez nunca a vida fácil. O basquetebol poderia ter-se convertido no seu trabalho se a hepatite e a mononucleose não tivessem interrompido a sua carreira no final do Instituto. Sem dúvida, sem esta enfermidade, Garcia não teria começado a actuar e dois directores como Brian De Palma e Francis Ford Coppola não o teriam contratado para um papel em Os Intocáveis e em Padrinho - III parte.

Mudou-se para Los Angeles em 1979 para empreender a sua carreira de actor e ali demonstrou de seguida ter uma identidade muito forte. A sua atracção era um dos seus pontos fortes, mas não gostava de despir-se. Assim, quando numa das suas primeiras audições lhe pediram que tirasse a camisa, foi-se batendo com a porta sem pensar muito.

O rosto de italo-americano e a sua voz profunda foram perfeitos para representar traficantes de heroína, polícias e mafiosos. Mas inclusive estando no cume do êxito depois da sua candidatura aos Oscar e a acertada interpretação em Ocean’s Eleven, nunca esqueceu as suas origens.

«Sou um exilado cubano – declara nesta entrevista exclusiva à Tempi por ocasião da estreio italiana da película Cristiada (For Greater Glory) – e sou católico. Estas coisas formam parte da minha vida e para mim não é difícil vivê-las em Hollywood, como tampouco o seriam em qualquer outro lugar».

Garcia é um homem de poucas palavras, mas os factos falam por ele: quando teria podido consagrar-se com películas simples e superficiais, decidiu em 2005 pôr-se atrás da câmara e dirigir a sua primeira longa-metragem, The Lost City, ambientado na sua cidade natal, La Habana, durante a revolução castrista.

Em 2012, «fascinado por um momento da história mexicana que conhecia muito pouco», aceitou participar em Cristiada, no papel do general Enrique Gorostieta Velarde, o militar ateu que guiou a revolta armada dos cristeros contra a perseguição religiosa do governo mexicano dos anos Vinte.

- Andy Garcia, o general Enrique Gorostieta é um personagem controverso e difícil. Porque aceitou interpretá-lo?
- O desenvolvimento emotivo de Gorostieta atraía-me muito como actor. Ele não é um homem religioso, mas crê no direito à liberdade religiosa, um direito que todo o mundo teria que ter. Há dois motivos pelos quais decide participar numa batalha com a qual não partilha, em princípio, os ideais: em parte pela sua esposa, muito devota, e em parte por si mesmo.

- Antes de entrar na guerra, da parte dos cristeros, Gorostieta confia a um amigo com uniforme: «Um homem que vive de recordações está já morto».
- Isto é exacto. A minha personagem é um militar e aceitar a proposta dos cristeros convém-lhe porque é um modo de voltar ao campo de batalha e voltar a entrar num mundo que tinha deixado para trás. Gorostieta tinha, efectivamente, uma história de grande êxito, sobretudo na guerra contra o político e revolucionário Zapata. 

- Que lhe atrai neste personagem?
- Gosto porque combate a sua guerra pela liberdade religiosa, deixa-se inspirar e impressionar pela paixão dos cristeros, que são verdadeiros crentes. A sua vida muda sobretudo um rapaz de 14 anos, José (beatificado por Bento XVI em 2005, ndr), que sacrifica a vida pela fé e que lhe faz viver uma espécie de epifania religiosa durante a película.

- A história de Cristiada é verdadeira, mas é praticamente desconhecida para todos, inclusive no México.
- Tivemos que investigar muito para realizar esta película. Demo-nos conta que inclusive no México esta parte da sua história é ainda um tabu e muito poucos a conhecem. O produtor José Pablo Barroso é mexicano e creio que decidiu contá-la para que se conhecesse e para recordar essas pessoas que deram a própria vida pela liberdade.

- A perseguição dos católicos não é um tema muito de moda. Sem dúvida, ali onde se distribuiu, a película teve muito êxito. Porquê?
- No México a película teve um êxito incrível e as salas estavam sempre cheias. Nos outros países talvez tenha sido um pouco boicotada, mas também teve êxito e não me surpreende. É uma película com uma estrutura clássica e recorda muitas dessas histórias épicas onde se representa a luta pela liberdade. Os valores e as imagens da película são muito fortes e creio que as pessoas sentem sempre curiosidade com os dramas da história. Esta película, além disso, foi rodada magnificamente, dá gosto vê-la, e está interpretada por excelente actores. Em resumo, penso que quando se realiza uma boa película as pessoas costumam ir vê-la. 

- Que sensação lhe deu "guiar" um exército disposto a dar a vida pela liberdade religiosa?
- A história mostrou-nos muitas vezes pessoas dispostas a sacrificar tudo. Neste caso fala-se de liberdade religiosa, que é um valor ainda maior que os outros, porque quando não há liberdade religiosa não pode existir nenhum outro tipo de liberdade. Às vezes, sem dúvida, o preço que há que pagar é drástico. Este é o tema da película.

- Cristiada estreia-se em Itália em 15 de Outubro, num momento em que a perseguição religiosa dos cristãos é um tema de grande actualidade.
- Esta película é universal e ainda que não fosse o seu fim específico, ilumina todos os casos de perseguição. Fala de México, mas lutar pelos próprios direitos é um conceito válido em qualquer latitude. A liberdade religiosa, como a da palavra, é um direito fundamental e nós somos afortunados de poder gozar da dita liberdade. Hoje não deveríamos tomar com ligeireza estas liberdades, porque há muitos países no mundo que as suprimem.

- Fala da sua terra natal?
- Eu venho de Cuba e a minha é uma família de exilados. Quando penso no meu país, que vive debaixo um regime e não goza de nenhuma liberdade, sinto uma grande dor e uma imensa tristeza. No meu coração há sempre uma ferida, o meu vínculo espiritual com Cuba não poderia romper-se jamais porque conheço bem o sofrimento da minha gente desde há cinquenta anos. Espero e rezo para que mais cedo ou mais tarde possa ser livre.

- É difícil escolher actuar numa película como Cristiada? Actualmente os católicos não estão muito bem vistos: não se corre o risco de que o etiquetem em Hollywood?
- Para mim não é nada complicado viver sendo eu mesmo. Tive uma vida abençoada e não o acho em absoluto difícil. Sobretudo quando penso nas pessoas da minha terra natal, dou-me conta de que a minha vida é um dom e estou consciente disso em cada instante. Ser um exilado forma parte da minha existência, como também o catolicismo, a religião na qual cresci. E para mim não é nada difícil ser católico em Hollywood, como em qualquer outra parte do mundo. Isto pelo menos é o que penso.

(Tradução de Helena Faccia Serrano, Alcalá de Henares)

 
Pode adquirir o DVD de Cristiada (e o livro clássico de Andrés Azkue sobre os cristeros) aqui em OcioHispano.es



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