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sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Natal na Síria: entre o medo e a esperança

Os cristãos são 10% da população
síria, ainda que muitos estão fugindo.

Ex-guia turístico relata o drama do povo, que, apesar da guerra, ainda lota as igrejas

Roma, 24 de Dezembro de 2014 (Zenit.org) Luca Marcolivio


Os cristãos na Síria se sentem abandonados e arriscam a vida todos os dias. No entanto, as igrejas estão activas e cheias de fiéis durante as missas, disse a ZENIT o cristão sírio Damaan Daoud, que trabalhava como guia turístico para grupos italianos antes do início da guerra. Daoud é um dos católicos sírios que tiveram a coragem de permanecer em seu país.
Ele conversou connosco também sobre as tradições natalícias da Síria, que viverá as festividades deste ano em meio à mistura de desespero e esperança, um autêntico símbolo da paixão de Jesus na cruz.

ZENIT: Qual era a sua actividade na Síria?
Daoud: Eu comecei como guia turístico para grupos de italianos em 1994, mas, desde 2011, fiquei sem esse trabalho. Continuo trabalhando como guia, só que agora não é para turistas, e sim para jornalistas, nos campos de batalha do conflito. Eu estava em Maalula em setembro de 2013, quando a cidade foi tomada pelos fundamentalistas da Frente Nusra, que é a Al-Qaeda na Síria. Actualmente também faço tradução de livros dos salesianos.

ZENIT: Como os sírios vivem o Natal? Quais são as tradições particulares?
Daoud: O Natal é uma festa nacional em que todo o povo participa, mas só os cristãos fazem o presépio. A maioria dos sírios monta a árvore de Natal em casa. Há cristãos que também fazem o jejum natalício, que dura quarenta dias e é uma antiga tradição cristã no Oriente Médio. É um período com muitos concertos nas igrejas e nos teatros. As ruas são decoradas, mas, nos últimos três anos, não vemos mais os enfeites porque muitas famílias perderam seus entes queridos e o país está meio destruído. Nesses três anos, 3 milhões de casas foram destruídas na Síria. Na vigília de Natal, todos os cristãos vão à igreja para a missa e depois ceiam. No dia de Natal, todas as famílias se reúnem com o “chefe” da família e cada região da Síria tem o seu prato tradicional. Por exemplo, o mais famoso em Damasco é o kibbebh (trigo moído fino com carne de cabrito, pistache, cebola e iogurte cozido).

ZENIT: Como vai ser este Natal na Síria? As pessoas sentem medo?
Daoud: Os cristãos na Síria têm medo e vivem com muita preocupação. Estão na mira do fanatismo e do radicalismo islâmico. Somos um alvo fácil de atacar e tivemos muitos mártires cristãos nesta guerra absurda. Quase a metade dos cristãos fugiu do país. A maior parte da comunidade cristã, que está em Aleppo, corre perigo porque tanto o Estado Islâmico e seus milicianos quanto a Frente Nusra os ameaçam continuamente. Os cristãos fogem de Aleppo: eu estive lá, faz um mês, e vi muito sofrimento e medo. O mesmo vale para os cristãos do nordeste de Síria, na região de Al-Qamishli, onde o Estado Islâmico assassinou e sequestrou muitos cristãos e se apropriou dos terrenos deles. É impossível ficar na Síria se não houver garantia de paz e segurança. É impossível pedir que os cristãos fiquem. No Ocidente, alguns nos criticam porque estamos com o regime de Damasco, mas não entendem que a oposição ao regime é mais sanguinária ainda. O milagre é que, apesar das enormes dificuldades, os refugiados cristãos mantêm uma forte fé em Jesus, o Emanuel. E as igrejas estão cheias de fiéis.

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