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quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

A barbárie do Isis e o papel ambíguo da Turquia

O exército turco violou a soberania territorial da Síria para evacuar uma estátua em memória do Império Otomano. O Isis, que controla a região, não interferiu em nada na operação.


Roma, 25 de Fevereiro de 2015 (Zenit.org) Naman Tarcha


Mais uma vez a história se repete. Nos mesmos territórios em que, há cem anos, os turcos cometeram o primeiro genocídio contra os cristãos no Oriente Médio (arménios, sírios, caldeus e assírios), as próprias vítimas são, hoje, perseguidas pelos terroristas do Estado islâmico.

Os jihadistas realizaram um novo ataque feroz em 30 aldeias sírias da comunidade cristã dos assírios, na província de Hasakah, no nordeste da Síria. A tentativa foi a de recuperar o terreno e encontrar rotas de fuga e suprimentos, dado o progresso das Forças Armadas sírias ao norte de Aleppo e a resistência das forças de defesa curdas. Tal Hermes, Tal Tamer, Tal Shmeram, Tal Tawil são só alguns dos vilarejos no riu Khabur, atacados pelos militantes com cerca de 40 carros armados na madrugada da segunda-feira.

Jack Bahnam Hindo, bispo da Igreja siro-católica em Hasakeh, confirmou que a maioria dos habitantes se refugiaram na cidade vizinha de Qameshli, mas pelo menos 70 civis - em sua maioria mulheres e crianças - estão nas mãos dos terroristas, e foram levados para um lugar desconhecido.

"Dezenas de cristãos assírios foram feitos reféns pelos jihadistas, provavelmente, a fim de usá-los como escudos humanos ou produto de resgate ou negociação", disse Mons Hindo, que critica duramente a coligação ocidental: "Quero dizer claramente que nós sentimos que fomos deixados sozinhos nas mãos de Daash (sigla em árabe para o Estado Islâmico do Iraque e Levante, ndr), aviões de combate americanos sobrevoaram a área, mas não intervieram".
Fontes locais falam de casas e habitações ocupadas e queimadas pelos ISIS: quatro homens das guardas locais foram mortos nos confrontos, e tocaram fogo na igreja de Al Shamiye, uma das mais antigas da Síria.

Os ataques terroristas foram realizados para romper o cerco imposto à área estratégica, Ras Alain, uma cidade de fronteira com a Turquia, e recuperar a rodovia que liga as cidades sírias de Qameshli e Hasakeh, ao longo da qual está localizado Al Raqaa, declarada capital do Estado islâmico.

As forças de defesa Assírias apoiadas pelos ataques aéreos do exército sírio expulsaram os terroristas e se preparam para o combate, enquanto que as forças de defesa curdas tinham retomado o controle de 20 aldeias nos últimos dias.

Enquanto isso, há também tensões entre a Síria e a Turquia. Na noite passada o exército turco entrou em território sírio para evacuar o mausoléu dedicado a Suleyman Shah, avô de Osman, fundador do Império Otomano, que morreu afogado em 1231, durante a travessia do rio Eufrates, perto da fortaleza de Jaabar. Embora o corpo nunca foi encontrado, foi construído um mausoléu em sua memória.

A construção foi em um lugar extraterritorial, sujeito a soberania turca, como resultado de um acordo entre a França e a Turquia, do 1921 (durante a era colonial francesa). No entanto, a estátua foi removida pelas autoridades sírias, em 1972, do lugar original para permitir a construção de grande barragem síria.

A intervenção do exército turco para defender a estátua de Suleyman Shah foi definida pelo governo de Damasco "uma agressão flagrante" que "Ankara irá responder". Vale notar que os milicianos do Isis, embora tenham explodido dezenas de templos, mausoléus e túmulos sagrados no Iraque e na Síria, sempre pouparam o mausoléu, o único que restou em pé, embora apenas a 100 km da cidade síria, Al Raqaa, declarada capital do Estado Islâmico.

A operação dos militares turcos não foi perturbada pelos combatentes curdos de Kobane nem pelo ISIS que controla a área, suscitando muitas perguntas. A Turquia é agora o único país capaz de libertar os reféns das mãos do auto proclamado Estado Islâmico: 49 pessoas foram resgatadas entre diplomatas e seus familiares, sequestrados no consulado turco em Mosul após o ataque da organização terrorista na cidade iraquiana.

O Governo turco logo afirmou que a operação da noite passada não é temporária, e em breve irá construir um novo mausoléu, mas sempre em território sírio, a 200 metros da fronteira turca perto de Aein Alarab (Kobane).

À Turquia de Erdogan atribui-se um papel ambíguo, dada a rejeição de participar da Coligação liderada pelos EUA.  Também a oposição turca acusa Erdogan e seu partido de conduzir políticas nocivas à custa da estabilidade e da segurança interna do País, através do apoio aos grupos armados na Síria.

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