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quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Ecologia: É necessário ir além das discussões politizadas

Professor Robert Gahl relembra nesta entrevista que maltratar o meio ambiente é uma ofensa a Deus


Roma, 24 de Fevereiro de 2015 (Zenit.org) Rocio Lancho García


O Santo Padre Francisco anunciou repetidamente que este ano publicará sua segunda Encíclica, e o tema abordado será a ecologia. Uma questão até agora não muito discutida na Igreja mas é cada vez mais evidente que deve nos preocupar, como cidadãos, mas também como cristãos, porque o meio ambiente é um dom que Deus deu ao homem para que fosse cuidado. Sobre estas questões Zenit falou com Padre Robert Gahl, professor de ética na Universidade Pontifícia da Santa Cruz em Roma.

Zenit: Por que agora a Igreja está mais preocupada com a ecologia?
É um ano particularmente importante por ocasião da Conferência das Nações Unidas sobre as mudanças climáticas que acontecerá em Paris de 30 de Novembro a 11 de Dezembro de 2015. Muitos acham que a Encíclica ajudará a reflexão neste encontro. Mas esta é uma razão circunstancial, pontual. Será a primeira encíclica papal sobre o tema da ecologia, e por que o Papa quer isso? Quer ensinar a todos, e não apenas os católicos, a cuidar mais do meio ambiente. Temos que lembrar que abordará questões mais recentes e aparentemente exóticas tais como lixo espacial, satélites em órbita... É importante entender porque o Papa quer abordar todas estas preocupações. Principalmente porque Deus colocou toda a criação nas mãos dos seres humanos e temos essa responsabilidade recebida por Deus. Nós exercemos o domínio de Deus sobre a criação. Desta forma, especialmente os baptizados podem viver esta tarefa de governar pelo "sacerdócio real".

Há uma outra razão. O Papa está muito preocupado com a periferia e a pobreza e percebe que estes sofrem especialmente por desastres ecológicos. No entanto, o progresso tecnológico está nas mãos das pessoas mais ricas.

Ao mesmo tempo, o Papa está preocupado porque viu na América Latina, a exploração da natureza por parte de grandes empresas multinacionais com objectivo de maximizar os lucros a qualquer custo.

É preciso prestar atenção porque muitos tentaram politizar esta questão e outros tentaram minimizar o teor da Encíclica. Por isso, é importante ir além das discussões politizadas. O Santo Padre, com sua autoridade moral, quer convidar a todos a serem criativos na forma de gerir isso e a avançarem em novos projectos.

Zenit: Recentemente, o Papa disse em uma homilia que se preocupar com o meio ambiente não é apenas uma questão de "verde". Por que é importante que os católicos também se preocupem com a ecologia?
Estou lembrando do discurso de Bento XVI no Bundestag, quando também falou do "verde". Ele disse que não havia mais "verde" como tal, porque todos os partidos estavam conscientes e comprometidos com o meio ambiente. E o Papa Francisco quer estar em continuidade com seu antecessor, também nisso.

Em alguns países, “o verde” foi associado ao anticlericalismo e é interessante o por que disso. A Igreja é naturalmente favorável à ecologia, mas há correntes de neo-paganismo que estão ligadas ao movimento ecológico. Mas não quer dizer que os católicos não estão comprometidos com a defesa do meio ambiente. Temos mais motivos para defender o meio ambiente, não porque "adoramos" o ambiente como se a Mãe Terra fosse uma deusa, mas porque é um dom de Deus e devemos deixa-la para os outros e temos a responsabilidade diante de Deus de cuidar deste lugar que Ele criou.

Um problema do movimento ecologista é quando se coloca o ambiente acima do homem, o homem deve servir a natureza. Mas de acordo com o cristianismo, o homem se preocupa com o meio ambiente. Devemos ver o meio ambiente como um jardim para cuidar, cultivar, semear e fazer frutificar.

Zenit: Um tema complexo e muito discutido relacionado ao cuidado do meio ambiente é o aquecimento global. Por que falta formação a este respeito?
Em parte, porque é altamente politizado. Na maioria das vezes é usado como slogan político para punir as nações, para conter a inovação. Também porque há muito dinheiro que depende das decisões políticas que são tomadas. Outra razão é a política populacional que pretende limitar os nascimentos nos países em desenvolvimento, que continuam com projetos neo-malthusianos, condenados pelo Papa.

Não se trata de acreditar ou não nas mudanças climáticas e no aquecimento global, é um fato científico. O que nos diz o magistério é que devemos cuidar do meio ambiente e temos de ser cautelosos, também diante das ideologias políticas anti pessoas humanas que aproveitam desses perigos para promover programas contra a família e a vida humana.

Zenit: Este ano teremos a Encíclica do Papa Francisco sobre a ecologia, mas o que os outros documentos do Magistério falam sobre esta problemática?
Dos documentos sobre a Doutrina Social da Igreja me parece importante a Caritas in Veritate. Também a Centesimus Annus faz referência. Há também um documento do Pontifício Conselho para a Cultura e do Pontifício Conselho para o Diálogo Inter-religioso, que trata sobre interpretações espiritualistas neo-pagãs e da Nova Era e aborda especificamente a questão da água. Mas este será o primeiro documento pontifício dedicado inteiramente ao meio ambiente.

Zenit: Por que você acha que a ecologia não foi uma questão de grande preocupação para a Igreja?
Do ponto de vista filosófico e científico, apenas após a Segunda Guerra Mundial se começou a reflectir sobre a relação entre o homem e o ambiente. Há um pensador muito importante chamado Hans Jonas, que escreveu um livro sobre o princípio da responsabilidade. Esta obra foi usada por muitos ambientalistas como linha guia metodológica, mas para a Igreja o foco é visto como um pouco exagerado, embora tenha ideias interessantes e profundas. O princípio da responsabilidade diz que não devemos fazer se não podemos provar que o que fazemos não terá um impacto muito negativo sobre o mundo. Este tipo de ‘prudência’ é muito conservadora e retarda a iniciativa, o empreendedorismo e a criatividade. Sem dúvidas, a Igreja tende a ver o homem de uma forma mais positiva, é verdade que existe o pecado, os riscos da tecnologia; mas a tecnologia também é uma fonte de iniciativas criativas e bem-estar para os homens. O progresso é positivo, mas deve ser bem utilizado. É importante pensar sobre questões como a reciclagem... A Igreja deve se preocupar com a formação da consciência moral das pessoas. Maltratar o meio ambiente é uma ofensa a Deus, porque Ele criou tudo isso, e também uma ofensa ao próximo.

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