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terça-feira, 9 de agosto de 2016

Juventude e Senectude

Durante a Jornada Mundial da Juventude, foi brutalmente degolado na igreja de Saint-Étienne-du-Rouvray, em Rouen, França, o Padre Jacques Hanel, de 86 anos, no final da Missa que estava a celebrar. Apesar da sua idade avançada, devemos olhar para o Padre Jacques como um jovem apaixonado. Jovem, sim, mas já com muitas provas de amor manifestadas ao longo da sua vida. Era essa a razão pela qual mantinha a sua atividade pastoral: “Alguma vez se viu um padre na reforma?”, costumava dizer. E sublinhava: “Vou trabalhar até ao meu último suspiro”.

Efetivamente, este sacerdote morreu dando a sua vida por amor, o grande amor da sua vida, um amor viril e juvenil, cheio de firmeza e esperança na felicidade que o esperava. O seu martírio não foi o momento mais importante da sua vida. Foi, talvez, o mais chamativo, o mais mediático. Foi, sobretudo, o desfecho natural de muitos momentos de oração, de mortificação, de estudo, de atenção aos seus paroquianos. Atos invisíveis aos olhos humanos, mas sempre presentes aos olhos de Deus. Deus olhou para o Padre Jacques com predileção e concedeu-lhe a virtude da fortaleza, a de ser fiel até ao “último suspiro”, como fora o seu Mestre, Jesus. Deu a sua vida durante a Santa Missa que é o Sacrifício da Cruz. Derramou o seu sangue para que o sangue de Cristo não faltasse para a salvação dos pecadores. E já há notícia de pessoas que, depois de conhecerem a notícia do martírio do Padre Jacques, decidiram a converter-se ao cristianismo. “Sangue de mártires, semente de cristãos”, dizia-se já entre os primeiros cristãos.

É bonito constatar como, sem ignorar a maldade do ato de matar, não se ergueu um grito generalizado de apelo à vingança ou à ira. Não há vozes a proclamarem “je suis charlie”, do jornal que se dedica a ridicularizar pessoas, sentimentos, crenças e ideais. O sentimento que se gerou foi de saudade por mais um “pai”, um “pai bom” que partiu e faz falta aos seus filhos espirituais, mas sem revolta, sem raiva, sem desejos de vingança. Pelo contrário: há desejos de reparar a falta, aceitando a vocação que Deus concede para o sacerdócio, como acontecerá a alguns jovens que participaram na recente Jornada Mundial da Juventude em Cracóvia (Polónia), também eles tocados por um Amor para toda a vida.

O martírio não é um mal, é uma bênção, para o mártir e para muitos que beneficiam com o seu martírio. São vários os exemplos que me ocorrem, começando pelo do próprio que Jesus que morreu perdoando aos seus executores, entre os quais estamos, o leitor e eu. Já no momento da agonia prometeu a salvação ao bom ladrão e, pouco depois de expirar, o centurião, responsável pela crucifixão, convertia-se. Santo Estêvão, enquanto estava a ser apedrejado, empregou as mesmas palavras de Jesus ao expirar: “Perdoai-lhes, porque não sabem o que fazem”. Saulo, o futuro S. Paulo, era ainda um adolescente quando assistiu a isso. Santa Maria Goretti, também ela, uma adolescente, perdoou ao seu assassino que pretendia roubar-lhe a virgindade. Ele viria a arrepender-se da sua má ação e a converter-se, tornando-se frade capuchino.

A comunicação dos santos é uma realidade cheia destas surpresas luminosas. Jovens cheios de sabedoria como os anciãos. Idosos cheios de amor como os jovens.

Isabel Vasco Costa


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