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sábado, 15 de abril de 2017

A Vela Torta


Não sei identificar o motivo mas não gosto de todo de ver as velas tortas, inclinadas, em particular sobre o altar. Um destes dias fui a uma cerimónia. Cheguei cedo e ainda consegui assistir aos preparativos para a celebração eucarística, que foram realizados com o maior cuidado.
 
Contudo, umas das velas sobre o altar, ao acender, ficou ligeiramente torta. Pedi a alguém que passou, que a mandasse endireitar. Anuiu a este meu pedido, dirigindo-se para a sacristia. Mas ninguém veio corrigir, talvez, porque entretanto, a cerimónia teve inicio ficando o meu pedido esquecido.
 
Os acontecimentos têm um fio condutor. O não ter sido corrigido o meu pedido teria algum significado. Por analogia comparei-me com a vela torta. Será que fiz, ao longo da vida, tudo o que Deus esperava de mim? Encontrava-me na Igreja de Santa Maria de Belém no Mosteiro dos Jerónimos. Ao fundo encontravam-se os túmulos de Vasco da Gama e de Luís de Camões, ou seja, relacionei este meu pensamento com a época áurea dos descobrimentos.
 
“Ide fazer discípulos de todas as nações… ensinai-lhes a cumprir tudo quanto vos mandei. Eu estou sempre convosco até ao fim dos tempos” (Mt. 28-20). Recordei a homilia que o Papa Bento XVI proferiu na celebração que teve lugar no Terreiro do Paço, em Maio de 2011, aquando da sua visita a Portugal, na qual recordou o caráter missionário do povo português, da necessidade da renovação da fé: “Nesta cidade de Lisboa de onde partiram um grande número de gerações e gerações de cristãos - bispos, sacerdotes, consagrados e leigos, homens e mulheres jovens e menos jovens obedecendo ao apelo do Senhor e armados simplesmente com esta certeza que o Senhor lhes deixou: “Eu estou sempre convosco”. Glorioso é o lugar conquistado por Portugal entre as nações pelo serviço prestado à dilatação da fé. Nas cinco partes do mundo, há igrejas locais que tiveram a sua origem na missionação portuguesa Nos tempos passados a vossa saída em demanda de outros povos não impediu nem destruiu os vossos vínculos, com o que éreis e acreditáveis, mas com a sabedoria cristã pudestes transplantar experiências e particularidades, abrindo-vos ao contributo dos outros, para serdes vós próprios em aparente debilidade, que é a força”.
 
A vela continua a arder torta. Questiono-me, voltando à época atual, se continuamos a levar a nossa identidade cultural e religiosa bem como todos os nossos contributos, por esse mundo fora. “Nação valente e imortal”, como refere o nosso Hino Nacional. Quero muito acreditar que sim. O brio de sermos portugueses deve alimentar o nosso ego, mas também nos deve inspirar um alto grau de responsabilidade.

Quero acreditar que sim que somos, de algum modo, o centro do mundo. Até Nossa Senhora escolheu o nosso país para aparecer aos três Pastorinhos em Fátima. Recordo que no ano 2017 se celebra o Centenário das aparições de Nossa Senhora nesse local bendito. Se Deus quiser, teremos no dia 13 de Maio o Santo Padre entre nós. Somos mesmo muito ricos em acontecimentos, continuamos pródigos em fazer história, não só em Portugal, bem como por esse mundo fora. Que grande responsabilidade nos foi concedida através das gerações, motivo de um orgulho bom. Deus permita, que com muita humildade, continuemos a ser merecedores, que possamos deixar às gerações vindouras um excelente legado de fé, de valores positivos, enquanto reflexo da nossa história e da nossa cultura milenária.

A cerimónia terminou. As velas foram apagadas. Dei graças a Deus pela existência da vela torta, que me transportaria para estes reflexões, que acabei de narrar, que por algum motivo, me vieram ao pensamento. “Deus escreve direito por linhas tortas”.
Maria Helena Paes



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