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quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

No te metas...

Dias atrás a torcida de um clube brasileiro tentou intimidar uma equipe argentina com arruaças nas proximidades do hotel em que se hospedava. Cenas de vandalismo e insuperável boçalidade, traduzida em violência. Foi-se o tempo em que nos achávamos bons de bola. Retrato do medo de perder no campo de jogo, sob o espírito de matilha a massa tentou influir no resultado horas antes da partida. Felizmente a estratégia fracassou e a equipa argentina, historicamente brava, levou o título, com todos os méritos. Venceu a competência. O povo brasileiro precisa perceber que não se vence na marra, para então buscar no passado e no presente os melhores exemplos.

Nomeado bem mais tarde diretor da Air France, Henri Guillaumet foi um dos pioneiros da aviação postal nos Andes, onde espatifou-se com seu Potez 25, na região de Mendoza, em 1930. Passara dos noventa voos na região e era um excelente piloto. Traído pelo mau tempo, tinha tudo para entregar-se ao desespero e morrer. Caminhou, por dias e noites, sem saber onde chegaria. Se fraquejasse, ainda que pouco, ou dormisse, o faria à sombra da morte. Quando o resgatou, inacreditavelmente vivo, Saint-Exupéry escutou a frase que traduziria a epopeia: “O que eu fiz, palavra que nenhum bicho, só um homem era capaz de fazer!”. Que exemplo! Piloto e escritor, Exupéry utilizaria a façanha em seu livro “Terra dos Homens”, publicado em 1939.

A recordação deste episódio consta da introdução da coleção “Para você, Meu Filho: Grandes Vocações”, patrocinada em 1959 pela Columbus, uma empresa especializada na produção e venda de cestas de Natal. Diante da estranheza geral pela iniciativa, porquanto fora de sua finalidade jurídica, a empresa justificou a decisão revelando sua preocupação com a juventude. Os editores da coleção, depois de criteriosa observação, concluíram que existiam poucos livros  de qualidade nas livrarias, enquanto sobejavam nas bancas de jornais “histórias em quadradinhos, com heróis inventados e metidos em estranhas vestes interplanetárias, usando carabinas atómicas e vivendo aventuras sem pés nem cabeça”.

Saint-Exupéry morreu em missão aérea, em 1944. Reza a lenda que o alemão que abateu sua aeronave teria lastimado sua pontaria. O que dizer dos desvarios humanos quando os homens não se reconhecem irmãos? Existem tempos de paz? Nunca. Quando silenciam tiros e bombas, retorna a sempiterna guerra comercial, industrial e tecnológica. Para o bem da humanidade, enquanto progresso, ou para o mal de multidões enquanto gera profundas desigualdades.

Em seu livro “A nova síndrome de Vichy”, Dalrymple diz que o homem é um bicho que está sempre a comparar-se e que o tão almejado sucesso não lhe basta: é preciso também que o outro falhe para que seu contentamento seja pleno. Como negar isto diante do que vemos em nosso quotidiano? Fora da caridade, que humaniza, o lado bicho toma conta. Nossa face animal predomina e garroteia nossa espiritualidade.

Passado pouco mais de meio século da publicação de “Grandes vocações”, o Brasil está mergulhado na dissolução, sem que se promovam os bons exemplos, menos raros do que se imagina. Nossa população prisional dobrou nos últimos dez anos e a pouca repercussão deste fato assustador parece revelar que a sociedade imagina que este drama será dissipado quando a economia voltar a crescer. Ora, criminalidade e crise económica não têm dependência linear. A crise, por maior que seja – gerada na estufa da incompetência e alimentada por interesses internacionais,- depaupera, mas não corrompe necessariamente. Mesmo na mais funda miséria, ainda que a preço  heróico, os valores são preservados se a formação familiar foi sólida.

Neste momento tremula no mundo a bandeira da ideologia de género que, segundo pensadores cristãos, destrói a família. Onde brotou esta cantilena? Com que propósito veio a lume? Destruir a família só aumentará nosso drama social. Quem tenta apagar fogo com gasolina é ignorante? Ou maldoso? Os que aplaudem, inocentes, merecem ajuda. Quanto aos que sabem bem o que fazem e fingem desconhecer as consequências, merecem enfrentamento intelectual. No Peru uma imensa passeata teve o bordão “No te metas com mis hijos”, denunciando a ideologia de género e o fascismo dos governos que ousam colocar suas patas na formação dos filhos, tarefa primordial da família. É crucial identificar a orquestração por trás de algumas coisas e travar o bom combate. Para que a humanidade não choque o ovo da serpente de um governo mundial. 

J. B. Teixeira





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